domingo, 21 de fevereiro de 2010

Estranho amor...

Há sensivelmente duas semanas, mais coisa, menos coisa, fui “aconselhado” por um presidente de Junta a ter calma, sugerindo-me que concedesse tempo-ao-tempo e não desatasse para aí a escrever em desfavor desta Câmara. Retorqui… e disse-lhe, quanto me era dado recordar, que apenas tinha redigido um pequeno texto em jeito de “pedido” ou “apelo”, imediatamente após a tomada de posse deste executivo, cujo título “ambição, precisa-se!” falava por si só.
Acredito que na génese desta abordagem estivesse subjacente a ideia de que eu me preparava para, a breve trecho, avançar com um escrito sobre os cem dias deste executivo.
Não! Nunca iria por aí, até porque sou daqueles que não acreditam nessa lengalenga do “balanço” de cem dias de governação, ciente, como estou, que esta é uma Câmara ainda “sem dias” e, portanto, sem história. Ademais, neste mesmo jornal esse trabalho já foi parcialmente feito, e digo parcialmente porque, salvo melhor opinião, esse inventário dos cem dias carecia do “contraditório”, ouvindo-se, igualmente, a oposição.
Porém, o que me traz hoje à liça é algo bem diferente, e prende-se com as recentes declarações de Marco António Costa, líder da distrital do Porto do PSD – acrescente-se, a maior distrital do país –, onde este refere a existência de “militantes que preferem que o PSD perca eleições, para eles não perderem o controlo do partido”. Meu Deus! Isto é de uma gravidade atroz!
Partido que se preze convocaria, de imediato, o presidente da distrital para que este, junto dos órgãos competentes, esclarecesse que (maus) militantes eram esses, seguindo-se o adequado e inerente procedimento disciplinar. Expulsão? Talvez! Por bem menos que isso já foram alguns expulsos e, como se escrevia há dias neste jornal, “todos sabemos que por vezes as expulsões deixam mágoas”. Sim, é verdade! Que o digam todos aqueles para quem, mais do que o acto meramente técnico e formal da expulsão, pesou sobremaneira a falta de justeza e de probidade na decisão.
Este Partido continua refém da intriga, da maledicência e até da traição. Até mesmo Sá Carneiro, fundador do PPD/PSD e o mais proeminente de entre todos os seus dirigentes, foi vítima dessa malfadada trilogia. A máquina partidária vai triturando os seus líderes um-a-um, a fazer lembrar um Benfica não-muito-distante com todos aqueles treinadores que por lá passaram. E agora que começa mais uma campanha eleitoral interna para a escolha de um novo líder, mais um(!), já se pressente a pequena picardia, o velho mexerico e a mais que previsível digladiação entre os diversos candidatos desta “balcanização” anunciada, num Partido que é, por si só, recordista absoluto no número de congressos e de líderes… e, já agora, de candidatos a líderes.
Não se pense que escrevo estas linhas com satisfação. Bem pelo contrário!
O país precisa de um PSD forte! O país reclama-o! Mas não este PSD, feito de contradições e desmandos. Um Partido onde a teoria não liga com a prática, onde o que se diz não é o que se faz, enfim, um Partido de trapalhadas e completamente à deriva num pântano de incoerências.
Exemplos? Sim, posso dar alguns! Sem pretender “esmiuçar” os tais cem dias da nova gestão autárquica e, ainda menos, sem desejar “atacar” a Câmara, fico-me aqui mesmo por Espinho e por algumas incongruências traduzidas em outras tantas interrogações.
Que Partido é este que na oposição reclamava uma diminuição nas taxas do IMI e da Derrama, sugerindo até ao anterior executivo que usasse a imaginação para obter novas receitas, e hoje mantém tudo igual porque nem tem imaginação nem baixa as taxas?
Que Partido é este que tanto se indignou quando o anterior presidente da Câmara alterou as reuniões do executivo, passando-as de semanais para quinzenais, e agora com oportunidade de voltar à fórmula anterior, isto é, retomar a periodicidade semanal, optou por deixar tudo na mesma?
Que Partido é este que via como uma “perigosa colagem” o bom relacionamento entre o executivo municipal e os presidentes de Junta de cor política diferente, e hoje segue exactamente pelo mesmo trilho político?
Que Partido é este que anteriormente reiterava a necessidade ou indispensabilidade da presença do presidente da Câmara, em todas as reuniões da Assembleia Municipal, mas agora já não vê nisso um problema ou uma prioridade?
Que Partido é este que na oposição tanto criticou a política lúdica da autarquia em relação à terceira idade, designadamente quanto aos famosos “passeios para idosos”, e vem agora dizer que afinal é tudo para continuar?
Que Partido é este que reivindicou a paternidade da obra do enterramento da linha, em túnel (como alternativa à vala inicialmente sugerida), que teve até um seu alto dirigente local a insurgir-se contra a “perigosa” pretensão de prolongar a extensão do túnel, pois essa exigência poderia comprometer irremediavelmente a obra do século, que Partido é este, dizia eu, que então apoiou incondicionalmente esta obra e hoje afirma-se contra aquilo que sempre defendeu?
Que Partido é este que tanto se exasperou com o facto de estarmos quase uma década à espera de uma revisão do PDM, e agora, enquanto poder, propõe-nos uma nova suspensão para, pleonasticamente falando, rever a revisão? Que coerência é esta? Quanto mais tempo vamos ter de esperar?
Chega? Creio que sim!
Resta-me, contudo, uma derradeira questão: que Partido é este que, malgrado todos estes dislates e absurdos, e vá-se lá saber porquê, continua a ser profunda e arrebatadamente amado, suscitando mesmo entusiásticas paixões que perduram toda uma vida?
Estranho amor… este!

Opinião de Correia de Araújo
in “Defesa de Espinho” de 18/Fevereiro/2010



7 comentários:

Anónimo disse...

Leitura perfeita e lúcida da realidade do País e de Espinho.
100% de acordo. Haja coragem para dizer as verdades... e lugar onde as dizer (não vá quererem silenciar o jornal).

David disse...

A ler com atenção estas verdades.
Uma critica acertiva, sem ser grosseira nem malcriada.

Anónimo disse...

E mai nada! Eh eh eh

Anónimo disse...

É preciso denunciar as contradições desta gente.
Dizem uma coisa e fazem outra.
Prometem mares e fundos e não vão fazer nada.

Anónimo disse...

QUE VERDADES! SIM SENHOR.

Anónimo disse...

A política tem que ser encarada de outra forma.
Com verdade, transparência e coragem, acima de tudo!

Carlos Vinagre disse...

O país, na minha opinião, precisa de assumir erros, purificar-se, e ao assumir os erros, seguir um caminho honesto, transparente- isso provará coragem, determinação- e creio que no fundo é o que as pessoas desejam. Isto aplica-se a todos os quadrantes da vida do nosso país, incluindo os partidos, os políticos, etc.